A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (27) submeter ao Plenário da Corte um Habeas Corpus (HC 110884) que discute se o chamado “tráfico privilegiado” deve ser considerado crime hediondo. O tráfico privilegiado seria aquele em que as penas podem ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o réu seja primário, tenha bons antecedentes e não se dedique a atividade criminosa e nem integre organização criminosa, ou seja, não faça do tráfico um meio de vida.
O HC foi impetrado pela defesa de A.C.P.S., condenado a 5 anos e 10 meses de reclusão por tráfico internacional de drogas, crime previsto na Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas). De acordo com a tese sustentada pelos advogados, o acusado teria praticado “tráfico privilegiado”, o que não deve ser considerado hediondo por não estar expressamente identificado no artigo 2º da Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/1990). O dispositivo, conforme a defesa, faz referência tão somente à figura do tráfico de entorpecentes, nos termos do caput do artigo 33 da Lei de Drogas.
A defesa também informou que inicialmente recorreu da condenação pedindo indulto com base no Decreto Presidencial 6.706/2008, que, segundo argumenta, desqualifica qualquer caráter hediondo do tráfico privilegiado e prevê expressamente que os condenados por tráfico de drogas que tenham sido beneficiados pelo artigo 33, parágrafo 4º, da Lei de Drogas podem também se beneficiar do indulto.
Esse argumento foi rejeitado pelo juiz das execuções penais, no entanto, houve um mutirão carcerário no local onde o acusado cumpre pena e seu caso foi reexaminado. Na ocasião, o juiz entendeu que ele fazia jus ao indulto porque já teria cumprido um terço de sua pena. Porém, o Ministério Público recorreu e o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJ-MS) cassou o benefício.
Plenário
A sugestão de submeter a questão ao Plenário foi do ministro Celso de Mello, uma vez que nenhuma das Turmas se pronunciou sobre o tema. O ministro Celso de Mello lembrou que o próprio Ministério Público Federal (MPF) já opinou pela concessão do Habeas Corpus.
O ministro Ricardo Lewandowski, relator do HC, e os demais integrantes da Segunda Turma concordaram com a sugestão de submeter o caso ao Plenário, “dada a sua relevância e o caráter constitucional da matéria”.
Relator
No início da sessão, antes da proposta sugerida pelo ministro Celso de Mello, o relator do processo se pronunciou no sentido de que a figura do tráfico privilegiado não retira o caráter hediondo do crime de tráfico de drogas. Ele fez referência à vedação prevista no artigo 44 da Lei 11.343/2006, na parte que trata do indulto.
O ministro afirmou que o inciso I do artigo 2º da Lei 8.072/1990 também proíbe a concessão de indulto aos condenados pelo delito de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins. “No que concerne à possibilidade de ser deferido o indulto aos condenados por tráfico ilícito de drogas, a Corte ainda não se pronunciou a respeito, pelo menos sob a perspectiva trazida neste HC”, destacou o ministro Lewandowski ao afirmar que “não há nenhuma violação constitucional na referida proibição que, aliás, está expressa no inciso XLIII do artigo 5º da Constituição Federal”.
“A causa especial de redução de pena prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/2006 não tem o condão de afastar o caráter hediondo do crime de tráfico de drogas, previsto no caput do mesmo artigo, para dar a ela definição jurídica diversa e autônoma”, destacou o relator ao afirmar que “existe apenas uma diferenciação entre o tráfico praticado pelo grande traficante, pelo criminoso habitual que faz desse crime seu meio de vida, e aquele praticado por pessoas que embora processados pelo mesmo delito, possuem um histórico de vida que as diferenciam dos demais traficantes. Contudo, tanto numa hipótese quanto noutra, o crime é de tráfico de drogas”, destacou o ministro.
Fonte: STF