Da mesma forma que o artigo 482 da CLT prevê as hipóteses de
justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador, o artigo
483, também da CLT, estabelece os motivos pelos quais o empregado poderá
considerar rescindido o contrato de trabalho e pedir a devida indenização. A
justa causa aplicável ao patrão tem cabimento quando, entre outras razões, a
empresa deixar de cumprir com as suas obrigações contratuais.
Nesse contexto, a 3ª Turma do TRT-MG entendeu que a
interrupção do fornecimento de vale transporte, quando essencial para a ida e a
volta do serviço, leva à declaração da rescisão indireta do contrato de
trabalho. Segundo sustentava a ré, que recorreu contra a rescisão indireta
declarada na sentença, a empregada não lhe comunicou a falta de vales
transporte. Na sua visão, a ausência da reclamante ao serviço configurou
abandono de emprego. Mas a juíza convocada Sueli Teixeira não deu razão à
empresa.
A empregada afirmou que a partir do final de novembro de
2009, a empregadora não mais realizou créditos referentes ao cartão BH-BUS, o
que impediu que se deslocasse para o serviço, já que morava em Santa Luzia e a
obra na qual prestava serviços ficava no bairro Ribeiro de Abreu, em Belo
Horizonte. Há documentos de dezembro de 2009 que demonstram que a reclamante
ajuizou ação contra a ré, pedindo a regularização do crédito no cartão BH-BUS.
Em defesa naquele processo, a reclamada acabou reconhecendo o não fornecimento
do beneficio, sob a justificativa de que a empregada estava utilizando carona
para ir e voltar do trabalho e vinha recebendo indevidamente o valor referente
aos vales transporte.
Em abril de 2010, a autora propôs nova ação, que foi anexada
à primeira, para julgamento conjunto, pedindo a rescisão indireta do contrato,
pois a empresa continuou não efetuando os depósitos referentes aos vales
transporte, impossibilitando o seu deslocamento para o trabalho. Em seguida, a
ré notificou-a a comparecer ao trabalho, sob pena de caracterização de abandono
de emprego, tudo com o objetivo de dispensá-la por justa causa. Além disso, a
reclamante informou que a reclamada vem descumprindo outras obrigações
contratuais, como o fornecimento de EPI e pagamento do adicional de
insalubridade.
De acordo com o que observou a relatora, a ré não comprovou nem
que a trabalhadora se deslocava para o emprego por meio de carona, nem que
existia crédito acumulado em seu cartão BH-BUS. Por outro lado, os
demonstrativos de pagamento da empregada, anexados ao processo, demonstraram
que, de novembro de 2009 a janeiro de 2010, houve desconto nos salários da
reclamante, referente à sua cota parte no custeio dos vales transporte.
Todavia, não se produziu prova qualquer de cumprimento da obrigação, frisou.
Pelo contrário, uma das testemunhas confirmou a não concessão do benefício para
a autora, relatando que até já teve de acompanhar a colega na viagem de volta
para custear a passagem dela com o seu cartão.
Não se pode pretender que o trabalhador custeie sozinho o
deslocamento residência-trabalho e vice-versa, em flagrante ofensa à Lei
7.418/85. E concretamente, ao não fornecer o vale-transporte, a ex-empregadora
acabou impedindo por completo a prestação de serviços, visto que a reclamante
não tinha como chegar ao local de trabalho, ponderou a juíza. Como se não
bastasse essa falta por parte do empregador, a perícia realizada constatou que
a empresa não concedia regularmente equipamentos de proteção individual e não
pagava adicional de insalubridade. A Turma entendeu que todos esses
descumprimentos contratuais, somados, são graves o suficiente para o término do
contrato por culpa do empregador e manteve a sentença que condenou a
empregadora ao pagamento das parcelas decorrentes da rescisão indireta do
contrato de trabalho.
( 0174800-41.2009.5.03.0015 RO )
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região